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    Mensaje por Maria Lua Lun 04 Dic 2023, 19:41


    VIA LÁCTEA




    ... Com meneios de frase de uma espiritualidade venenosa...
    ... Rituais de púrpura rota, cerimoniais misteriosos de ritos contemporâneos
    de ninguém’.
    ... Sequestradas sensações sentidas noutro corpo que o físico, mas corpo e
    físico ao seu modo, intervalando subtilezas entre complexo e simples...
    Lagoas onde paira, pelúcida, uma intuição de ouro fosco, tenuemente
    despida de se ter alguma vez realizado, e sem dúvida por coleantes requintes,
    lírio entre mãos muito brancas...
    ... Pactos entre o torpor e a angústia, verde-negros, tépidos à vista, cansados
    entre sentinelas de tédio...
    ... Nácar de inúteis consequências, alabastro de frequentes macerações —
    ouro, roxo e orlas os entretenimentos com ocasos, mas não barcos para
    melhores margens, nem pontes para crepúsculos maiores...
    ... Nem mesmo à beira da ideia de tanques, de muitos tanques, longínquos
    através de choupos, ou ciprestes talvez, segundo as sílabas de sentida com que
    a hora pronunciava o seu nome.
    Por isso janelas abertas sobre cais, contínuo marulhar contra docas, séquito
    confuso como opalas, louco e absorto, entre o que amarantos e terebintos
    escrevem a insónias de entendimento nos muros obscuros de poder ouvir...
    ... Fios de prata rara, nexos de púrpura desfiada, sob tílias sentimentos
    inúteis, e por áleas onde buxos calam, pares antigos, leques súbitos, gestos
    vagos, e melhores jardins sem dúvida esperam o cansaço plácido de não mais
    que áleas e alamedas...


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    Mensaje por Maria Lua Lun 04 Dic 2023, 19:42

    ***

    Quincôncios, caramanchões, cavernas de artifício, canteiros feitos, repuxos,
    toda a arte ficada de mestres mortos que tinham, entre duelos íntimos de
    insatisfeito com evidente, decidido procissões de coisas para sonhos pelas ruas
    estreitas das aldeias antigas das sensações...
    Toadas a mármore em longes palácios, reminiscências pondo mãos sobre as
    nossas, olhares casuais de indecisões ocasos em céus fatídicos, anoitecendo
    em estrelas sobre silêncios de impérios que decaem...
    Reduzir a sensação a uma ciência, fazer da análise psicológica um método
    preciso como um instrumento de microscópio — pretensão que ocupa, sede
    calma, o nexo de vontade da minha vida...
    E entre a sensação e a consciência dela que se passam todas as grandes
    tragédias da minha vida. Nessa região indeterminada, sombria, de florestas e
    sons de água toda, neutral até ao ruído das nossas guerras, decorre aquele meu
    ser cuja visão em vão procuro...
    Jazo a minha vida. (As minhas sensações são um epitáfio, por de mais
    extenso sobre a minha vida morta.) Aconteço-me a morte e ocaso. O mais
    que posso esculpir é sepulcro meu a beleza interior.






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    Mensaje por Maria Lua Lun 04 Dic 2023, 19:43

    ***


    Os portões do meu afastamento abrangem para parques de infinito, mas
    ninguém passa por eles, nem no meu sonho — mas abertos sempre para o
    inútil e de ferro eternamente para o falso...
    Desfolho apoteoses nos jardins das pompas interiores e entre buxos de
    sonho piso, com uma sonoridade dura, as áleas que conduzem a Confuso.
    Acampei Impérios no Confuso, à beira de silêncios, na guerra fulva em que
    acabará o Exato.
    O homem de ciência reconhece que a única realidade para si é ele próprio, e
    o único mundo real o mundo como a sua sensação lho dá. Por isso, em lugar
    de seguir o falso caminho de procurar ajustar as suas sensações às dos outros,
    ciência objetiva, procura, antes, conhecer perfeitamente o seu mundo, e a sua
    personalidade. Nada mais objetivo do que os seus sonhos. Nada mais seu do
    que a sua consciência de si. Sobre essas duas realidades requinta ele a sua
    ciência. É muito diferente já da ciência dos antigos científicos, que, longe de
    buscarem as leis da sua própria personalidade e a organização dos seus
    sonhos, procuravam as leis do "exterior" e a organização daquilo a que
    chamavam "Natureza".










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    Mensaje por Maria Lua Miér 06 Dic 2023, 08:27

    ***


    ***
    Em mim o que há de primordial é o hábito e o jeito de sonhar. As
    circunstâncias da minha vida, desde criança sozinho e calmo, outras forças
    talvez, amoldando-me, de longe, por hereditariedades obscuras ao seu sinistro
    corte, fizeram do meu espírito uma constante corrente de devaneios. Tudo o
    que eu sou está nisto, e mesmo aquilo que em mim mais parece longe de
    destacar o sonhador, pertence sem escrúpulo à alma de quem só sonha,
    elevada ela ao seu maior grau.
    Quero, para o meu próprio gosto de analisar-me, ir, à medida que a isso me
    ajeite, ir pondo em palavras os processos mentais que em mim são um só,
    esse, o de uma vida devotada ao sonho, de uma alma educada só em sonhar.
    Vendo-me de fora, como quase sempre me vejo, eu sou um inapto à ação,
    perturbado ante ter que dar passos e fazer gestos, inábil para falar com os
    outros, sem lucidez interior para me entreter com o que me cause esforço ao
    espírito, nem sequência física para me aplicar a qualquer mero mecanismo de
    entretenimento trabalhando.
    Isso é natural que eu seja. O sonhador entende-se que seja assim. Toda a
    realidade me perturba. A fala dos outros lança-me numa angústia enorme.
    A realidade das outras almas surpreende-me constantemente. A vasta rede
    de inconsciências que é toda a ação que eu vejo parece-me uma ilusão
    absurda, sem coerência plausível, nada.
    Mas se se julgar que desconheço os trâmites da psicologia alheia, que erro a
    perceção nítida dos motivos e dos íntimos pensamentos dos outros, haverá
    engano sobre o que sou.









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    Mensaje por Maria Lua Miér 06 Dic 2023, 08:28

    ***

    Porque eu não só sou um sonhador, mas sou um sonhador exclusivamente.
    O hábito único de sonhar deu-me uma extraordinária nitidez de visão interior.
    Não só vejo com espantoso e às vezes perturbante relevo as figuras e os
    clécors dos meus sonhos, mas com igual relevo vejo as minhas ideias
    abstratas, os meus sentimentos humanos — o que deles me resta -, os meus
    secretos impulsos, as minhas atitudes psíquicas diante de mim próprio.
    Afirmo que as minhas próprias ideias abstratas, eu as vejo em mim, eu com
    uma interior visão real as vejo num espaço interno. E assim os seus meandros
    são-me visíveis nos seus mínimos.
    Por isso conheço-me inteiramente, e, através de conhecer-me inteiramente,
    conheço inteiramente a humanidade toda. Não há baixo impulso, como não
    há nobre intuito que me não tenha sido relâmpago na alma; e eu sei com que
    gestos cada um se mostra. Sob as máscaras que as más ideias usam, de boas ou
    indiferentes, mesmo dentro de nós eu pelos gestos as conheço por quem são.
    Sei o que em nós se esforça por nos iludir. E assim à maioria das pessoas que
    vejo conheço melhor do que eles a si próprios. Aplico-me muitas vezes a
    sondá-los, porque assim os torno meus. Conquisto o psiquismo que explico,
    porque para mim sonhar é possuir. E assim se vê como é natural que eu,
    sonhador que sou, seja o analítico que me reconheço.




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    Mensaje por Maria Lua Miér 06 Dic 2023, 08:29

    ***

    Entre as poucas coisas que às vezes me apraz ler, destaco, por isso, as peças
    de teatro. Todos os dias se passam peças em mim, e eu conheço a fundo
    como é que se projeta uma alma na projeção de Mercator, planamente.
    Entretenho-me pouco, aliás, com isto; tão constantes, vulgares e enormes são
    os erros dos dramaturgos. Nunca nenhum drama me contentou. Conhecendo
    a psicologia humana com uma nitidez de relâmpago, que sonda todos os
    recantos com um só olhar, a grosseira análise e construção dos dramatistas
    fere-me, e o pouco que leio neste género desgosta-me como um borrão de
    tinta atravessado na escrita.
    As coisas são a matéria para os meus sonhos; por isso aplico uma atenção
    distraidamente sobreatenta a certos detalhes do Exterior.
    Para dar relevo aos meus sonhos preciso conhecer como é que as paisagens
    reais e as personagens da vida nos aparecem relevadas. Porque a visão do
    sonhador não é como a visão do que vê as coisas. No sonho, não há o
    assentar da vista sobre o importante e o inimportante de um objeto que há na
    realidade. Só o importante é que o sonhador vê. A realidade verdadeira de um
    objeto é apenas parte dele; o resto é o pesado tributo que ele paga à matéria
    em troca de existir no espaço. Semelhantemente, não há no espaço realidade
    para certos fenómenos que no sonho são palpavelmente reais. Um poente real
    é imponderável e transitório. Um poente de sonho é fixo e eterno. Quem sabe
    escrever é o que sabe ver os seus sonhos nitidamente (e é assim) ou ver em
    sonho a vida, ver a vida imaterialmente, tirando-lhe fotografias com a máquina
    do devaneio, sobre a qual os raios do pesado, do útil e do circunscrito não
    têm ação, dando negro na chapa espiritual.





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    Mensaje por Maria Lua Miér 06 Dic 2023, 08:30

    ***

    Em mim esta atitude, que o muito sonhar me enquistou, faz-me ver sempre
    da realidade a parte que é sonho. A minha visão das coisas suprime sempre
    nelas o que o meu sonho não pode utilizar. E assim vivo sempre em sonhos,
    mesmo quando vivo na vida. Olhar para um poente em mim ou para um
    poente no Exterior é para mim a mesma coisa, porque vejo da mesma
    maneira, pois que a minha visão é talhada mesmamente.
    Por isso a ideia que faço de mim é uma ideia que a muitos parecerá errada.
    De certo modo é errada. Mas eu sonho-me a mim próprio e de mim escolho o
    que é sonhável, compondo-me e recompondo-me de todas as maneiras até
    estar bem perante o que exijo do que sou e não sou. Às vezes o melhor modo
    de ver um objeto é anulá-lo; mas ele subsiste, não sei explicar como, feito de
    matéria de negação e anulamento; assim faço a grandes espaços reais do meu
    ser, que, suprimidos no meu quadro de mim, me transfiguram para a minha
    realidade.
    Como então me não engano sobre os meus íntimos processos de ilusão de
    mim? Porque o processo que arranca para uma realidade mais que real um
    aspeto do mundo ou uma figura de sonho, arranca também para mais que real
    uma emoção ou um pensamento; despe-o portanto de todo o apetrecho de
    nobre ou puro quando, o que quase sempre acontece, o não é. Repare-se que
    a minha objetividade é absoluta, a mais absoluta de todas. Eu crio o objeto
    absoluto, com qualidades de absoluto no seu concreto.








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    Mensaje por Maria Lua Miér 06 Dic 2023, 08:30

    ***

    Eu não fugi à vida
    propriamente, no sentido de procurar para a minha alma uma cama mais
    suave, apenas mudei de vida e encontrei nos meus sonhos a mesma
    objetividade que encontrava na vida. Os meus sonhos — noutra página
    estudo isto — erguem-se independentes da minha vontade e muitas vezes me
    chocam e me ferem. Muitas vezes o que descubro em mim me desola, me
    envergonha (talvez por um resto de humano em mim — o que é a vergonha?)
    E me assusta.
    Em mim o devaneio ininterrupto substituiu a atenção. Passei a sobrepor às
    coisas vistas, mesmo quando já sonhadamente vistas, outros sonhos que
    comigo trago. Desatento já suficientemente para fazer bem aquilo a que
    chamei ver as coisas em sonho, ainda assim, porque essa desatenção era
    motivada por um perpétuo devaneio e uma, também não exageradamente
    atenta, preocupação com o decurso dos meus sonhos, sobreponho o que
    sonho ao sonho que vejo e interseciono a realidade já despida da matéria com
    um imaterial absoluto.
    Daí a habilidade que adquiri em seguir várias ideias ao mesmo tempo,
    observar as coisas e ao mesmo tempo sonhar assuntos muito diversos, estar
    ao mesmo tempo sonhando um poente real sobre o Tejo real e uma manhã
    sonhada sobre um Pacífico interior; e as duas coisas sonhadas intercalam-se
    uma na outra, sem se misturar, sem propriamente confundir mais do que o
    estado emotivo diverso que cada um provoca, e sou como alguém que visse
    passar na rua muita gente e simultaneamente sentisse de dentro as almas de
    todos — o que teria que fazer numa unidade de sensação — ao mesmo tempo
    que via os vários corpos — esse tinha que os ver diversos — cruzar-se na rua
    cheia de movimentos de pernas.




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     FERNANDO PESSOA II   (13/ 06/1888- 30/11/1935) ) - Página 6 Empty Re: FERNANDO PESSOA II (13/ 06/1888- 30/11/1935) )

    Mensaje por Maria Lua Sáb 09 Dic 2023, 08:55

    ***

    APÊNDICES
    Textos que citam o nome de Vicente Guedes


    APÊNDICE 1.


    O meu conhecimento com Vicente Guedes formou-se de um modo
    inteiramente casual. Encontrávamo-nos muitas vezes no mesmo restaurante
    retirado e barato. Conhecíamo-nos de vista; descaímos, naturalmente, no
    cumprimento silencioso. Uma vez, que nos encontrámos à mesma mesa,
    tendo o acaso proporcionado que trocássemos duas frases, a conversa seguiuse. Passámos a encontrarmo-nos ali todos os dias, ao almoço e ao jantar. Por
    vezes saíamos juntos, depois do jantar, e passeávamos um pouco,
    conversando.
    Vicente Guedes suportava aquela vida nula com uma indiferença de mestre.
    Um estoicismo de fraco alicerçava toda a sua atitude mental.
    A constituição do seu espírito condenava-o a todas as ânsias; a do seu
    destino a abandoná-las a todas. Nunca encontrei alma, de quem pasmasse
    tanto. Sem ser por um ascetismo qualquer, este homem abdicara de todos os
    fins, a que a sua natureza o havia destinado. Naturalmente constituído para a
    ambição, gozava lentamente o não ter ambições nenhumas.





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    o un ciego soñando
    y en ese vuelo y en ese sueño
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    siendo guardián en tu cielo
    y tren de tus ilusiones."
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    Mensaje por Maria Lua Sáb 09 Dic 2023, 08:56

    ***


    APÊNDICE 2.


    ... Este livro suave. É quanto resta e restará de uma das almas mais subtis
    na inércia, mais debochadas no puro sonho que tem visto este mundo. Nunca
    — eu o creio — houve criatura por fora humana que mais complexamente
    vivesse a sua consciência de si própria. Dandy no espírito, passeou a arte de
    sonhar através do acaso de existir.
    Este livro é a biografia de alguém que nunca teve vida’... De Vicente
    Guedes não se sabe nem quem era, nem o que fazia, nem este livro não é dele:
    é ele. Mas lembremo-nos sempre de que, por detrás de tudo quanto aqui está
    dito, coleia na sombra, misterioso
    Para Vicente Guedes ter consciência de si foi uma arte e uma moral; sonhar
    foi uma religião.
    Ele criou definitivamente a aristocracia interior, aquela atitude de alma que
    mais se parece com à própria atitude de corpo de um aristocrata completo.




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    Mensaje por Maria Lua Sáb 09 Dic 2023, 08:57

    ***
    APÊNDICE 3

    As misérias de um homem que sente o tédio da vida do terraço da sua vila
    rica são uma coisa; são outra coisa as misérias de quem, como eu, tem que
    contemplar a paisagem do meu quarto num 4º. Andar da Baixa, e sem poder
    esquecer que é ajudante de guarda-livros.
    "Tout notaire a rêvé des sultanes"...
    Tenho um prazer íntimo, da ironia do ridículo imerecido, quando, sem que
    alguém estranhe, declaro, nos actos oficiais, em que é preciso dizer a
    profissão: empregado no comércio. Não sei como inserto o meu nome vem
    assim no Anuário Comercial.

    Epígrafe ao Diário:
    Guedes (Vicente), empregado no comércio, Rua dos Retroseiros, 17-4º.

    Anuário Comercial de Portugal
    II. Matéria fragmentária da "Marcha Fúnebre para o Rei Luís Segundo
    Baviera"






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    Mensaje por Maria Lua Sáb 09 Dic 2023, 08:58

    ***



    APÊNDICE 4.

    E para ti, ó Morte, vá a nossa alma e a nossa crença, a nossa esperança e a
    nossa saudação!
    Senhora das Últimas Coisas, Nome Carnal do Mistério e do Abismo –
    alenta e consola quem te busca, sem te ousar procurar!
    Senhora da Consolação, Lago ao luar, entre rochedos, Longe da lama e da
    poluição da Vida!
    Virgem-Mãe do Mundo absurdo, forma do Caos incompreendido, alastra e
    estende o teu reino sobre todas as coisas — sobre as flores que pressentem
    que murcham, sobre as feras que estremecem de velhas, sobre as almas que
    nasceram para te amar entre o erro e a ilusão da vida!
    A vida, espiral do Nada, infinitamente ansiosa por o que não pode haver.



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    Mensaje por Maria Lua Lun 11 Dic 2023, 13:52

    ***



    APÊNDICE 5.

    Trazei vós o pálio de ouro e morte, cavaleiro da decifração inútil. A sangue
    e rosas lembrai o sonho inútil que se estiolou nos jarros, antes da mão branca
    que os soltasse. Pisai leve, como arauto das sedas, a sala queda, no antebrilho
    do tédio, na hora mortiça dos candelabros claros, no charão das pedrarias
    fechadas à chave e aborrecimento.
    Quem vós éreis, senhor, ficou entre as sereias, no esquecimento lunar dos
    mares mortos. Ouviu as canções da doença das águas, que não chegam à lua
    senão por desejo, e desfolhou, uma a uma, as rosas no jardim do palácio do
    conseguimento interrompido. O som de violões de haver melhores coisas
    afastou a atenção dos seus ouvidos das palavras imperiais entre rumores.
    A vossa mão deixou a mão de quem interrompeu porque foi preciso ir mais
    a perto da lonjura trazida por suspiros. O lago entre árvores era como um
    sonho de água no meio de arvoredos de ilhas, e o desejo? Era como uma hora
    de luar parado ao acontecimento nuvem, o céu incerto e a passagem de pajens







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    Mensaje por Maria Lua Lun 11 Dic 2023, 13:54

    ***


    APÊNDICE 6.


    ... E baixada a ponte levadiça, para que entre, quando chegue para entrar



    APÊNDICE 7.


    O homem magro sorriu desleixadamente. Olhou-me com uma
    desconfiança que não era malévola. Depois sorriu novamente, mas com
    tristeza. Baixou depois outra vez os olhos sobre o prato. Continuou jantando
    em silêncio e absorção.






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    Mensaje por Maria Lua Sáb 16 Dic 2023, 06:30

    ***

    APÊNDICE 8.



    (Cópia de uma carta para Pretória)
    5/6/1914



    Eu tenho passado bem de saúde e o espírito tem estado curiosamente
    menos maldisposto. Ainda assim uma vaga inquietação anda a torturar-me,
    uma coisa a que eu não posso chamar senão uma comichão intelectual, como
    se eu fosse ter bexigas na alma. É só nesta linguagem absurda que eu lhe
    posso descrever o que sinto. Tudo isto, porém, não se aparenta propriamente
    com aqueles estados tristes de espírito, de que às vezes lhe falo, e em que a
    tristeza é caraterizadamente uma tristeza sem causa. Este meu estado de alma
    atual tem uma causa. Em torno de mim está-se tudo afastando e
    desmoronando. Não emprego estes dois verbos no sentido entristecedor.
    Quero apenas dizer que na gente com quem lido se estão dando, ou se vão
    dar, mudanças, acabares de períodos de vida, e que tudo isto — como a um
    velho que vê morrerem no seu redor os seus companheiros de infância, a sua
    morte parece próxima — me sugere não sei de que misteriosa maneira, que a
    minha deve, vai, mudar também. Repare que eu não creio que esta mudança
    vá ser para pior; creio o contrário. Mas é uma mudança, e para mim mudar,
    passar de uma coisa para ser outra, é uma morte parcial; morre qualquer coisa
    de nós, e a tristeza do que morre e do que passa não pode deixar de nos roçar
    pela alma.
    Veja: amanhã vai para — não a, mas para — Paris o meu maior e mais
    íntimo amigo. A tia Anica (veja a carta dela) não é improvável que vá breve
    para a Suíça com a filha, casada então. Vai para a Galiza, para lá estar bastante
    tempo, um outro rapaz muito meu amigo. Passa a viver no Porto um outro
    rapaz que é, depois do primeiro que lhe citei, o meu amigo mais próximo.
    Assim, no meu redor humano, tudo se organiza (ou se desorganiza) de modo
    a ir-me, não sei se isolando, não sei se chamando para um novo caminho que
    não vejo. Mesmo a circunstância de eu ir publicar um livro vem alterar a
    minha vida. Perco uma coisa — o ser inédito. E assim mudar para melhor,
    porque mudar é mau, é sempre mudar para pior. E perder um defeito, ou uma
    deficiência, ou uma negação, sempre é perder. Imagine a Mamã como não
    viverá, de dolorosas sensações quotidianas, uma criatura que sente desta
    maneira!
    Que serei eu daqui a dez anos — de aqui a cinco anos, mesmo? Os meus
    amigos dizem-me que eu serei um dos maiores poetas contemporâneos —
    dizem-no vendo o que eu tenho já feito, não o que poderei fazer (senão eu
    não citava o que eles dizem...). Mas sei eu ao certo o que isso, mesmo que se
    realize, significa? Sei eu a que isso sabe? Talvez a glória saiba a morte e a
    inutilidade, e o triunfo cheire a podridão.




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    Mensaje por Maria Lua Sáb 16 Dic 2023, 06:31

    ***


    APÊNDICE 9.

    Mais "pensamentos"

    Dia de Natal. Humanismo. A "realidade" do Natal é subjetiva. Sim, no meu
    ser. A emoção, como veio, passou. Mas um momento convivi com as
    esperanças e as emoções de gerações inúmeras, com as imaginações mortas de
    toda uma linhagem morta de místicos. Natal em mim!
    Sociologia — a inutilidade das teorias e práticas políticas.
    A crueldade da dor — gozar o sofrer, por gozar a própria personalidade
    consubstanciada com a dor. O último refúgio sincero da ânsia de viver e da
    sede de gozar;


    ****

    Amores Cruéis

    Serás quem eu quiser. Farei de ti um ornamento da minha emoção, posta
    onde quero, e como quero, dentro de mim. Contigo não tens nada. Não és
    ninguém, porque não és consciente; apenas vives.
    Qu'est il de frère en toi et ceux qui veulent vivre?
    O meu espírito está com como os clássicos fazem, e com que os decadentes
    dizem.









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    Mensaje por Maria Lua Sáb 16 Dic 2023, 06:33

    ***

    APÊNDICE 10.


    Amores com a chinesa de uma chávena de porcelana
    Razões:
    Os nossos amores decorriam tranquilos, como ela queria, nas duas
    dimensões do espaço apenas.



    APÊNDICE 11.

    A Sociedade em que eu vivo
    Toda de sonho. Os meus amigos sonhados. As suas famílias, hábitos,
    profissões e…


    APÊNDICE 12.

    Há uma técnica do sonho, como as há das diversas realidades, desde a…


    APÊNDICE 13.

    Sensações nascem analisadas.

    Requinte entre a sensação e a consciência dela, não entre a sensação e o
    "facto".
    Regra de vida: submeter-se a tudo socialmente.
    O casamento bom porque artificial. — O artifício e o absurdo é o sinal do
    humano



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    Mensaje por Maria Lua Sáb 16 Dic 2023, 06:36

    ***


    APÊNDICE 14.


    Um outro tédio, ou o mesmo, mais baço, mais connosco, mais todo a sós
    connosco, mais E connosco.
    Pasmei com todo o corpo.


    APÊNDICE 15.


    Súbdito incoerente de todas as sensações que ferem para além da razão de
    ser da ferida, cioso de todos os direitos do absurdo e do…


    APÊNDICE 16.


    Como uma criança que pára de correr, arrastando um bater alto de pés
    breves, e respirando curto...


    APÊNDICE 17.


    G. Junqueiro? Tenho uma grande indiferença pela obra dele. Já o vi...
    Nunca pude admirar um poeta que me foi possível ver.










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    Mensaje por Maria Lua Dom 17 Dic 2023, 22:08

    ***

    APÊNDICE 18.


    Sou curioso de todos, ávido de tudo, voraz da ideia de todas. Pesa-me
    como a perda de a noção que tudo não pode ser visto, nem tudo lido, nem
    tudo pensado...
    Mas não vejo atentamente’, nem leio com importância, nem penso com
    prosseguimento. Em tudo sou um diletante intenso e fruste.
    A minha alma é fraca de mais para ter sequer a força do seu próprio
    entusiasmo. Sou feito das ruínas do inacabado e é uma paisagem de
    desistências a que definiria o meu ser.
    Divago, se me concentro; tudo em mim é decorativo e incerto, como um
    espetáculo na bruma.
    Esta tendência carnal para converter todo pensamento em expressão, ou
    antes, pensar como expressão todo pensamento; de ver toda a emoção em cor
    e forma, e até toda negação em ritmo,
    Escrevo com uma grande intensidade de expressão; o que sinto nem sei o
    que é. Sou metade sonâmbulo e a outra parte nada.
    A mulher que sou quando me conheço.











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    Mensaje por Maria Lua Dom 17 Dic 2023, 22:09

    ***

    O ópio dos crepúsculos régios e a maravilha deitada às escuras, à mão que
    se desenrosca dos farrapos.
    Às vezes é tão grande, tão rápida, tão abundante a fluência concentrada de
    imagens e de frases certas que se me desenrola no espírito desatento, que
    raivo, estorço-me, choro de ter que as perder — porque as perco. Cada uma
    teve o seu momento e não pode ser lembrada fora dele. E fica-me, como a um
    amoroso a saudade de um rosto amável entrevisto e não fixado, a memória do
    meu ser como de mortos, o debruçar-me sobre o abismo de um passado
    rápido de imagens e ideias, figuras mortas da bruma de que elas mesmas se
    formaram.
    Fluido, ausente, inessencial, perco-me de mim como se me afogasse em
    nada; sou transato e esta palavra, que fala e pára, diz, tem, tudo.
    O ritmo da palavra, a imagem que evoca, e o seu sentido como ideia, juntos
    necessariamente em qualquer palavra, são para mim juntos com separação.
    Só de pensar uma palavra eu compreenderia o conceito de Trindade. Penso
    a palavra "inúmero" e escolho-a para exemplo porque é abstrata e escusa. Mas
    se a oiço no meu ser, rolam grandes ondas em som que não pára no mar sem
    fim; constelam-se os céus, e não é de estrelas, mas da música de todas as
    ondas onde os sons se constelam, e a ideia de um infinito decorrente abre-seme, como uma bandeira desfraldada, a estrelas ou sons do mar, e a um eu que
    reflete todas as estrelas.



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    Mensaje por Maria Lua Dom 17 Dic 2023, 22:10

    ***


    Que D. Sebastião venha pelo nevoeiro não desdiz da história. Toda a
    história vai e vem entre névoas, e as maiores batalhas de que se narram, as
    maiores pompas, os mais largos conseguimentos não são mais que espetáculos
    na bruma, cortejos na distância do crepúsculo e do apagamento.
    A alma em mim é expressiva e material. Ou estagno num não-ser de linho
    sensível, ou acordo, e se acordo projeto-me em palavras como se essas fossem
    o abrir de olhos do meu ser. Se penso, o pensamento surge-me no próprio
    espírito com frases, secas e ritmadas, e eu não distingo nunca bem se penso
    antes de o dizer, se apenas depois de me ver a tê-lo dito e, se por mim
    sonhado, há palavras logo em mim. Em mim toda emoção é uma imagem e
    todo sonho uma pintura musicada. O que escrevo pode ser mau, mas é mais
    em que o que penso. Assim por vezes o acredito.
    Desde que vivo, narro-me, e o mais pequeno dos meus tédios comigo, se
    me debruço sobre eles, desabrocha, por um magnetismo de E em flores de
    cores de musicais abismos.


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    Mensaje por Maria Lua Dom 17 Dic 2023, 22:13

    NOTAS E CARTAS DE FERNANDO PESSOA
    RELATIVAS AO LIVRO DO DESASSOSSEGO


    I
    EXCERTOS DE ALGUMAS CARTAS


    A João de Lebre e Lima, em 3 de Maio de 1914:



    A propósito de tédios, lembra-me perguntar-lhe uma coisa... Viu, num
    número do ano passado, de A Águia, um trecho meu chamado Na floresta do
    alheamento? Se não viu, diga-me. Mandar-lho-ei. Tenho imenso interesse que
    você conheça esse trecho. É o único trecho meu publicado em que eu faço do
    tédio, e do sonho estéril e cansado de si próprio mesmo ao ir começar a
    sonhar-se, um motivo e o assunto. Não sei se lhe agradará o estilo em que o
    trecho está escrito: é um estilo especialmente meu, e a que aqui vários rapazes
    amigos, brincando, chamam "o estilo alheio", por ser naquele trecho que
    apareceu. E referem-se a "falar alheio", "escrever em alheio", etc.
    Aquele trecho pertence a um livro meu, de que há outros trechos escritos
    mas inéditos, mas de que falta ainda muito para acabar; esse livro chama-se
    Livro do Desassossego, por causa da inquietação e incerteza que é a sua nota
    predominante. No trecho publicado isso nota-se. O que é em aparência um
    mero sonho, ou entressonho, narrado, é — sente-se logo que se lê, e deve, se
    realizei bem, sentir-se através de toda a leitura — uma confissão sonhada da
    inutilidade e dolorosa fúria estéril de sonhar.


    ****





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    Mensaje por Maria Lua Dom 17 Dic 2023, 22:15

    ***


    A Armando Cortes-Rodrigues, em 2 de Setembro de 1914:



    Nada tenho escrito que valha a pena mandar-lhe. Ricardo Reis e Álvaro
    futurista — silenciosos. Caeiro perpetrador de algumas linhas que encontrarão
    talvez asilo num livro futuro. ... O que principalmente tenho feito é sociologia
    e desassossego. V. Percebe que a última palavra diz respeito ao "livro" do
    mesmo; de facto tenho elaborado várias páginas daquela produção doentia. A
    obra vai pois complexamente e tortuosamente avançando.







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    Mensaje por Maria Lua Mar 19 Dic 2023, 09:11

    ***


    A Armando Cortes-Rodrigues, em 4 de Outubro de 1914:
    Nem lhe mando outras pequenas coisas que tenho escrito nestes dias. Não
    são muito dignas de serem mandadas, umas; outras estão do Livro do
    Desassossego. Verdade seja que descobri um novo género de paulismo....
    O meu estado de espírito atual é de uma depressão profunda e calma.
    Estou há dias ao nível do Livro do Desassossego. E alguma coisa dessa obra
    tenho escrito. Ainda hoje escrevi quase um capítulo todo.




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    Mensaje por Maria Lua Lun 25 Dic 2023, 07:45

    ***









    A Armando Cortes-Rodrigues, em 19 de Novembro de 1914:

    O meu estado de espírito obriga-me agora a trabalhar bastante, sem querer,
    no Livro do Desassossego. Mas tudo fragmentos, fragmentos, fragmentos.




    A João Gaspar Simões, em 28 de Julho de 1932:


    Primitivamente, era minha intenção começar as minhas publicações por
    três livros, na ordem seguinte: Portugal, que é um livro pequeno de poemas
    (tem 41 ao todo), de que o Mar Português Contemporânea é a segunda parte;
    Livro do Desassossego (Bernardo Soares, mas subsidiariamente, pois que o
    B.S. não é um heterónimo, mas uma personalidade literária); Poemas
    Completos de Alberto Caeiro (com o prefácio de Ricardo Reis, e, em
    posfácio, as Notas para a Recordação do Álvaro de Campos). Mais tarde, no
    outro ano, seguiria, só ou com qualquer livro, Cancioneiro (ou outro título
    igualmente inexpressivo), onde reuniria (em Livros 1 a III ou 1 a V) vários dos
    muitos poemas soltos que tenho, e que são por natureza inclassificáveis salvo
    de essa maneira inexpressiva.
    Sucede, porém, que o Livro do Desassossego tem muita coisa que
    equilibrar e rever, não podendo eu calcular, decentemente, que me leve menos
    de um ano a fazê-lo. E, quanto ao Caeiro, estou indeciso. ...



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    Mensaje por Maria Lua Lun 25 Dic 2023, 07:46

    ***


    A Adolfo Casais Monteiro, em 13 de Janeiro de 1935:


    Como escrevo em nome destes três? Caeiro, por pura e inesperada
    inspiração, sem saber ou sequer calcular que iria escrever. Ricardo Reis, depois
    de uma deliberação abstrata, que subitamente se concretiza numa ode.
    Campos, quando sinto um súbito impulso para escrever e não sei o quê. (O
    meu semi-heterónimo Bernardo Soares, que aliás em muitas coisas se parece
    com Álvaro de Campos, aparece sempre que estou cansado ou sonolento, de
    sorte que tenha um pouco suspensas as qualidades de raciocínio e de inibição;
    aquela prosa é um constante devaneio. É um semi-heterónimo porque, não
    sendo a personalidade a minha, é, não diferente da minha, mas uma simples
    mutilação dela. Sou eu menos o raciocínio e a afetividade. A prosa, salvo o
    que o raciocínio dá de ténue à minha, é igual a esta, e o português
    perfeitamente igual; ao passo que Caeiro escrevia mal o português, Campos
    razoavelmente mas com lapsos como dizer "eu próprio" em vez de "eu
    mesmo", etc., Reis melhor do que eu, mas com um purismo que considero
    exagerado. ..







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    Mensaje por Maria Lua Lun 25 Dic 2023, 07:47

    ***



    II

    DUAS NOTAS

    Nota para as edições próprias (e aproveitável para o "Prefácio")
    Reunir, mais tarde, num livro separado, os poemas vários que havia errada
    tenção de incluir no Livro do Desassossego; este livro deve ter um título mais
    ou menos equivalente a dizer que contém lixo ou intervalo, ou qualquer
    palavra de igual afastamento.
    Este livro poderá, aliás, formar parte de um definitivo de refugos, e ser o
    armazém publicado do impublicável que pode sobreviver como exemplo
    triste. Está um pouco no caso dos versos incompletos do lírico morto cedo,
    ou das cartas do grande escritor, mas aqui o que se fixa é não só inferior senão
    que é diferente, e nesta diferença consiste a razão de publicar-se pois não
    poderia consistir em a de se não dever publicar.

    L. Do D. (nota)







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    Mensaje por Maria Lua Lun 25 Dic 2023, 07:49

    ***


    A organização do livro deve basear-se numa escolha, rígida quanto possível,
    dos trechos variadamente existentes, adaptando, porém, os mais antigos, que
    falhem à psicologia de Bernardo Soares, tal como agora surge, a essa vera
    psicologia. À parte isso, há que fazer uma revisão geral do próprio estilo, sem
    que ele perca, na expressão íntima, o devaneio e o desconexo lógico que o
    caracterizam.
    Há que estudar o caso de se se devem inserir trechos grandes, classificáveis
    sob títulos grandiosos, como a Marcha Fúnebre do Rei Luís Segundo da
    Baviera, ou a Sinfonia de uma Noite Inquieta. Há a hipótese de deixar como
    está o trecho da Marcha Fúnebre, e há a hipótese de a transferir para outro
    livro, em que ficassem os Grandes Trechos juntos.
    C. Do Prefácio às Ficções do Interlúdio
    Umas figuras insiro em contos, ou em subtítulos de livros, e assino com o
    meu nome o que elas dizem; outras projeto em absoluto e não assino senão
    com o dizer que as fiz. Os tipos de figuras distinguem-se do seguinte modo:
    mas que destaco em absoluto, o mesmo estilo me é alheio, e, se a figura o
    pede, contrário, até, ao meu; nas figuras que subscrevo não há diferença do
    meu estilo próprio, senão nos pormenores inevitáveis, sem os quais elas se
    não distinguiriam entre si.
    Compararei algumas destas figuras, para mostrar, pelo exemplo, em que
    consistem essas diferenças. O ajudante de guarda-livros Bernardo Soares e o
    Barão de Teive — são ambos figuras minha mente alheias — escrevem com a
    mesma substância de estilo, a mesma gramática, e o mesmo tipo e forma de
    propriedade: é que escrevem com o estilo que, bom ou mau, é o meu.
    Comparo as duas porque são casos de um mesmo fenómeno – a inadaptação
    à realidade da vida e, o que é mais, a inadaptação pelos mesmos motivos e
    razões. Mas ao passo que o português é igual no Barão de Teive e em
    Bernardo Soares, o estilo difere em que o do fidalgo é intelectual, despido de
    imagens, um pouco, como o direi?, hirto e restrito; e o do burguês é fluido,
    participando da música e da pintura, pouco arquitetural. O fidalgo pensa claro,
    escreve claro, e domina as suas emoções, se bem que não os seus sentimentos;
    o guarda-livros nem emoções nem sentimentos domina, e quando pensa é
    subsidiariamente a sentir.
    Há notáveis semelhanças, por outra, entre Bernardo Soares e Álvaro de
    Campos. Mas, desde logo, surge em Álvaro de Campos o desleixo do
    português, o desatado das imagens, mais íntimo e menos propositado que o
    de Soares.
    Há acidentes do meu distinguir uns de outros que pesam como grandes
    fardos no meu discernimento espiritual. Distinguir tal composição musicante
    de Bernardo Soares de uma composição de igual teor que é a minha...
    Há momentos em que o faço repentinamente, com uma perfeição de que
    pasmo; e pasmo sem imodéstia, porque, não crendo em nenhum fragmento
    de liberdade humana, pasmo do que se passa em mim como pasmaria do que
    se passasse em outros — em dois estranhos.
    Só uma grande intuição pode ser bússola nos descampados da alma; só com
    um sentido que usa da inteligência, mas se não assemelha a ela, embora nisto
    com ela se funda, se pode distinguir estas figuras de sonho na sua realidade de
    uma a outra.
    Nestes desdobramentos de personalidade ou, antes, invenções de
    personalidades diferentes, há dois graus ou tipos, que estarão revelados ao
    leitor, se os seguiu, por características distintivas. No primeiro grau, a
    personalidade distingue-se por ideias e sentimentos próprios, distintos dos
    meus, assim como, em mais baixo nível desse grau, se distingue por ideias,
    postas em raciocínio ou argumento, que não são minhas, ou, se o são, o não
    conheço. O Banqueiro Anarquista é um exemplo deste grau inferior; o Livro
    do Desassossego, e a personagem Bernardo Soares, são o grau superior.
    Há o leitor de reparar que, embora eu publique o Livro do Desassossego
    como sendo de um tal Bernardo Soares, ajudante de guarda-livros na cidade
    de Lisboa, o não incluí todavia nestas Ficções do Interlúdio. É que Bernardo
    Soares, distinguindo-se de mim pelas suas ideias, seus sentimentos, seus
    modos de ver e de compreender, não se distingue de mim pelo estilo de
    expor. Dou a personalidade diferente através do estilo que me é natural, não
    havendo mais que a distinção inevitável do tom especial que a própria
    especialidade das emoções necessariamente projeta.
    Nos autores das Ficções do Interlúdio não são só as ideias e os sentimentos
    que se distinguem dos meus: a mesma técnica da composição, o mesmo estilo,
    é diferente do meu. Aí cada personagem é criada integralmente diferente, e
    não apenas diferentemente pensada. Por isso nas Ficções do Interlúdio
    predomina o verso. Em prosa é mais difícil de se outra.










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    Mensaje por Maria Lua Lun 25 Dic 2023, 07:50

    ***

    D. "Ideias metafísicas do Livro do Desassossego"



    A única realidade para mim são as minhas sensações. Eu sou uma sensação
    minha. Portanto nem da minha própria existência estou certo. Posso está-lo
    apenas daquelas sensações a que eu chamo minhas.
    A verdade? É uma coisa exterior? Não posso ter a certeza dela, porque não
    é uma sensação minha, e eu só destas tenho a certeza. Uma sensação minha?
    De quê? Procurar o sonho é pois procurar a verdade, visto que a única
    verdade para mim sou eu próprio. Isolar-me tanto quanto possível dos outros
    é respeitar a verdade.
    Toda a metafísica é a procura da verdade, entendendo por Verdade a
    verdade absoluta. Ora a Verdade, seja ela o que for, e admitindo que seja
    qualquer coisa, se existe, existe ou dentro das minhas sensações, ou fora delas
    ou tanto dentro como fora delas. Se existe fora das minhas sensações, é uma
    coisa de que eu nunca posso estar certo, não existe para mim portanto, é, para
    mim, não só o contrário da Certeza, porque só das minhas sensações estou
    certo, mas o contrário de ser, porque a única coisa que existe para mim são as
    minhas sensações. De modo que, a existir fora das minhas sensações, a
    Verdade é para mim igual à Incerteza e não-ser — não existe e não é a
    verdade, portanto. Mas concedamos o absurdo de que as minhas sensações
    possam ser o erro, e o não-ser (o que é absurdo, visto que elas, com certeza,
    existem) – nesse caso a verdade é o ser e existe fora das minhas sensações
    totalmente. Mas a ideia Verdade é uma ideia minha; existe, por isso, dentro
    das minhas sensações: portanto, no que Verdade abstrata e fora de mim, a
    verdade existe dentro de mim — contradição, portanto; e erro,
    consequentemente.
    A outra hipótese é que a verdade existe dentro das minhas sensações. Nesse
    caso ou é a soma delas todas, ou é uma delas, ou parte delas. Se é uma delas,
    em que se distingue das outras? Se é uma sensação, não se distingue essencialmente das outras, e, para que se distinguisse, era preciso que se distinguisse
    essencialmente. E se não é uma sensação, não é uma sensação. — Se é parte
    das minhas sensações, que parte? As sensações têm duas faces — a de serem
    sentidas e a de serem dadas como coisas sentidas, a parte pela qual são minhas
    e a parte pela qual são de "coisas". E uma destas partes, que a Verdade, a ser
    parte das minhas sensações, tem de ser. (Se é de qualquer modo um grupo de
    sensações unificando-se ao constituir uma só sensação, cai sob a garra do
    raciocínio que conduz à hipótese anterior.) Se é uma das duas faces — qual? A
    face "subjetiva"? Ora essa face subjetiva aparece-me sob uma de duas formas
    — ou a da minha "individualidade" una ou a de uma múltipla individualidade
    "minha". No primeiro caso é uma sensação minha como qualquer outra e já
    fica refutada no argumento anterior. No segundo caso, essa verdade é múltipla
    e diversa, é verdades — o que é contraditório com a ideia de Verdade, valha
    ela o que valer. Será então a face objetiva? O mesmo argumento se aplica,
    porque ou é uma unificação dessas sensações numa ideia de um mundo
    exterior — e essa ideia ou não é nada ou é uma sensação minha, e se é uma
    sensação, já fica refutada essa hipótese; ou é de um múltiplo mundo exterior, e
    isso reduz-se às minhas sensações, então pluralidade de modos é a essência da
    ideia de Verdade.
    Resta analisar se a Verdade é o conjunto das minhas sensações. Essas
    sensações ou são tomadas como uma ou como muitas. No primeiro caso
    voltamos à já rejeitada hipótese. No segundo caso a Verdade como ideia
    desaparece, porque se consubstancia com a totalidade das minhas sensações.
    Mas para ser a totalidade das minhas sensações, mesmo concebidas como
    minhas sensações, nuamente, a verdade fica dispersa — desaparece. Porque,
    ou se baseia na ideia de totalidade, que é uma ideia (ou sensação) nossa, ou
    não se apoia em parte nenhuma. Mas nada prova, mesmo, a identidade de
    verdade e totalidade. Portanto, a verdade não existe.
    Mas nós temos a ideia...
    Temos, mas vemos que não corresponde a "Realidade" nenhuma, suposto
    que realidade significa qualquer coisa. A Verdade é, portanto, uma ideia ou
    sensação nossa, não sabemos de quê, sem significado, portanto sem valor,
    como qualquer outra sensação nossa.
    Ficamos, portanto, com as nossas sensações por única "realidade",
    realidade que "realmente" até tem aqui certo valor, mas é uma conveniência
    para frasear. De "real" temos apenas as nossas sensações, mas "real" (que é
    uma sensação nossa) não significa nada, nem mesmo "significa" significa
    qualquer coisa, nem "sensação" tem um sentido, nem "tem um sentido" é
    coisa que tenha sentido algum. Tudo é o mesmo mistério. Reparo, porém, em
    que nem tudo pode significar coisa alguma, ou "mistério" é palavra que tenha
    significação.



    FIN








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    Mensaje por Maria Lua Sáb 30 Dic 2023, 07:30

    POEMA EM LINHA RETA (Álvaro de Campos /Fernando Pessoa)

    Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
    Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

    E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
    Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
    Indesculpavelmente sujo,
    Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
    Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
    Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das
    etiquetas,
    Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
    Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
    Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
    Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
    Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
    Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
    Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
    Para fora da possibilidade do soco;
    Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
    Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

    Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
    Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
    Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

    Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
    Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
    Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
    Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
    Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
    Ó príncipes, meus irmãos,

    Arre, estou farto de semideuses!
    Onde é que há gente no mundo?

    Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

    Poderão as mulheres não os terem amado,
    Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
    E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
    Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
    Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
    Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


    ***********************


    Poema en línea recta, del heterónimo Álvaro de Campos




    Nunca he conocido a nadie a quien le hubiesen molido a
    palos.
    Todos mis conocidos han sido campeones en todo.

    Y yo, tantas veces despreciable, tantas veces inmundo,
    tantas veces vil,
    yo, tantas veces irrefutablemente parásito,
    imperdonablemente sucio,
    yo, que tantas veces no he tenido paciencia para bañarme,
    yo, que tantas veces he sido ridículo, absurdo,
    que he tropezado públicamente en las alfombras de las
    ceremonias,
    que he sido grotesco, mezquino, sumiso y arrogante,
    que he sufrido ofensas y me he callado,
    que cuando no me he callado, he sido más ridículo todavía;
    yo, que les he parecido cómico a las camareras de hotel,
    yo, que he advertido guiños entre los mozos de carga,
    yo, que he hecho canalladas financieras y he pedido prestado
    sin pagar,
    yo, que, a la hora de las bofetadas, me agaché
    fuera del alcance las bofetadas;
    yo, que he sufrido la angustia de las pequeñas cosas
    ridículas,
    me doy cuenta de que no tengo par en esto en todo el
    mundo.

    Toda la gente que conozco y que habla conmigo
    nunca hizo nada ridículo, nunca sufrió una afrenta,
    nunca fue sino príncipe - todos ellos príncipes - en la vida...

    ¡Ojalá pudiese oír la voz humana de alguien
    que confesara no un pecado, sino una infamia;
    que contara, no una violencia, sino una cobardía!
    No, son todos el Ideal, si los oigo y me hablan.
    ¿Quién hay en este ancho mundo que me confiese que ha
    sido vil alguna vez?
    ¡Oh príncipes, hermanos míos,
    ¡Leches, estoy harto de semidioses!
    ¿Dónde hay gente en el mundo?

    ¿Seré yo el único ser vil y equivocado de la tierra?

    Podrán no haberles amado las mujeres,
    pueden haber sido traicionados; pero ridículos, ¡nunca!
    Y yo, que he sido ridículo sin que me hayan traicionado,
    ¿cómo voy a hablar con esos superiores míos sin titubear?
    Yo, que he sido vil, literalmente vil,
    vil en el sentido mezquino e infame de la vileza.





    ********************
    Quizás los versos más consagrados y reconocidos internacionalmente de Pessoa son los del “Poema en línea recta”, una extensa creación con la cual hasta el día de hoy nos identificamos profundamente.

    Los siguientes versos fueron escritos entre 1914 y 1935. Durante la lectura, nos damos cuenta de cómo el heterónomo concibe a la sociedad y la crítica, observando y diferenciándose de los que lo rodean.

    Aquí encontramos una serie de denuncias a las máscaras, la falsedad e hipocresía de la sociedad que aún siguen vigentes. El poeta confiesa al lector su inadaptación ante un mundo contemporáneo que funciona por medio de apariencias.

    El poema crea un panorama del sujeto poético, y también de la sociedad portuguesa de la cual hacía parte el autor.


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    "Ser como un verso volando
    o un ciego soñando
    y en ese vuelo y en ese sueño
    compartir contigo sol y luna,
    siendo guardián en tu cielo
    y tren de tus ilusiones."
    (Hánjel)





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